Do abandono para o abraço - Cristãos Palestinos em Lausanne IV | Por Valdir Steuernagel - El Blog de Bernabé

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viernes, 27 de septiembre de 2024

Do abandono para o abraço - Cristãos Palestinos em Lausanne IV | Por Valdir Steuernagel

Dia do abandono!


Era o quarto dia do congresso e o que era latente veio à tona com dor e a força de um endosso institucional. Inacreditável. Um email problemático, enviado pelo diretor do Congresso de Lausanne 4, se distanciava de uma das apresentações mais contundentes do evento. Nesta apresentação, autorada por Ruth Padilla DeBorst, se tematizava a justiça de Deus e se apontava para a violência da guerra em Israel e seus milhares de mortos, especialmente em Gaza. Este foi apenas um dos temas apontado, num mosaico de realidades de injustiça vivido em nosso tempo. “Perdão”, o email disse. A organização do evento não havia prestado a devida atenção ao conteúdo do texto apresentado e houveram coisas que passaram despercebidas.

Certo, certo, certo, haviam detalhes teológicos que estavam em jogo, o que a própria autora da apresentação veria a reconhecer, mas e a guerra? As mortes? As vidas? E as igrejas? E os cristãos que vivem e sofrem a esta cruel realidade? Nenhuma palavra? Nenhum gesto? Eles serão, mais uma vez, simplesmente abandonados?

Dia do abandono!

Foi o dia 25 de setembro de 2024, o quarto dia do Congresso. O dia está marcado: abandono. O dia foi marcado pelas lágrimas das irmãs e dos irmãos das igrejas Palestinas. Atenção! Eles estão presentes e, apesar das milhares de lágrimas já derramaram, no decorrer destes longos meses, uma vez mais elas vieram e vieram quentes. Vieram enquanto estavam cercados de milhares de cristãos dos mais diferentes lugares e que, uma vez mais, raramente se deram conta das lágrimas de uma igreja sofrida, perseguida e decrescente. O sentimento de abandono não poderia ser mais profundo, mais dolorido, mais inacreditável.

Inacreditável de tantos jeitos. Inacreditável por ter sido desencadeado por este email expedido por aqueles que haviam aprovado a própria vinda destes cristãos palestinos. Inacreditável por estar acontecendo no dia em que se tematizava a igreja perseguida e a igreja sofrida, ao mesmo tempo em que o silêncio em torno à igreja palestina falava bem alto. Um silêncio que dizia que a igreja global não se importava. Não os necessitava, fazendo eco a uma das frases tópicas do evento que denunciava o pecado do isolacionismo - I don’t need you.

Desse descarte os irmãos e irmãs já sabiam, mas não sabiam que doía tanto experimentá-lo bem ao lado daqueles que lhes passavam de largo, usando uma imagem que entendemos.

O abandono não poderia ser mais sofrido e denunciador de um corpo fraturado e machucado. Corpo de Cristo.

Dia do abraço

Eu vi! Eu vi que havia, também, outras lágrimas. Lágrimas vindas de outros olhos marejados e que, nascendo do fundo da alma, queriam expressar arrependimento e solidariedade. É fato. Tem muitos outros que tem lágrimas a derramar. Há muitos outras almas que, em solidariedade, tem espaço para chorar.

Vamos, pois, mover os nossos corpos em busca das sofridas lágrimas destas irmãs e irmãos, em busca de transformar o dia do abandono, no dia do abraço.

Sei. É preciso ir devagar, pois antes de abraçar é preciso reconhecer o abandono, e mesmo descaso, ao qual submetemos aquelas igrejas e aqueles irmãos. É preciso fazer o que este evento nos conclamou: arrependimento. Penitência, foi dito muitas vezes.

Agora, como vimos aqui, o arrependimento não é abstrato, mas real e tem várias facetas. Para enumerá-las é necessário escutar aos irmãos e irmãs da Palestina para que possamos deixar entrar em nós o clamor deles. O clamor por serem reconhecidos e não esquecidos e ignorados. O clamor para não serem vítimas de uma teologia que não tem lugar para eles, como participantes do “Israel de Deus”. O clamor que pede pela suspensão do envio das armas pelas quais serão mortos e pelo pronto cessar fogo e término da guerra. O clamor pela participação na reconstrução tanto da igreja como de suas comunidades, como sinal de um Deus que não abandona mas está presente e o faz através do seu corpo.

Então, e só então, o dia do abandono poderá ser seguido pelo dia do abraço. Um abraço que, com verdadeiras tintas escatológicas, pode iniciar com o compartilhamento das lágrimas.

Será que podemos esperar por outro email?
 
Sobre o autor:

Valdir Steuernagel faz parte da Visão Mundial (World Vision) desde 1989, onde presidiu os conselhos nacional e internacional da organização. Atualmente, atua como embaixador da Visão Mundial Brasil e da Aliança Cristã Evangélica Brasileira, além de ser colunista da revista Ultimato. É pastor luterano com mestrado e doutorado (PhD) pela Lutheran School of Theology em Chicago, Estados Unidos.

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