Leão XIV e os desafios contemporâneos: Igualdade de gênero e a igreja | Por Vanessa Carvalho de Mello - El Blog de Bernabé

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martes, 13 de mayo de 2025

Leão XIV e os desafios contemporâneos: Igualdade de gênero e a igreja | Por Vanessa Carvalho de Mello

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A escolha do nome Leão XIV pelo novo papa gerou diversas análises sobre seu significado simbólico e suas possíveis implicações para o futuro da Igreja Católica. Teólogos, teólogas e especialistas na área realizaram interpretações acerca da designação pontifícia, estabelecendo conexões históricas relevantes. Carregada de simbolismo, sua decisão remete a figuras emblemáticas cuja atuação em defesa da justiça social e da inclusão pode fornecer indícios sobre os rumos de seu papado.

O nome Francis, já presente no nome de batismo do pontífice, evoca a figura de São Francisco de Assis, referência central no cristianismo, cujo legado enfatiza a humildade, a solidariedade com os pobres e o compromisso com a justiça social. Além disso, a associação a Frei Leão, um dos seguidores mais próximos de São Francisco no século XIII, reforça a ideia de continuidade dos valores franciscanos dentro do novo papado.

Outro aspecto relevante da simbologia do nome está na relação com Leão XIII, pontífice do século XIX, amplamente reconhecido como um dos grandes defensores da Doutrina Social da Igreja. Sua atuação incluiu críticas contundentes à exploração dos trabalhadores e um posicionamento firme contra a escravidão. Dessa forma, a escolha do nome Leão XIV pode sinalizar uma intenção de dar continuidade às políticas progressistas do Papa Francisco, promovendo pautas ligadas à justiça social e aos direitos humanos. No entanto, surge uma questão fundamental: qual será sua abordagem em relação aos direitos das mulheres?

A Igreja e os Direitos das Mulheres: Tensões entre Tradição e Mudança

Historicamente, a relação da Igreja Católica com as pautas femininas tem sido marcada por tensões entre tradição e mudança, e a eleição do novo papa reacende o debate sobre o papel das mulheres na instituição, bem como a possibilidade de avanços em direção à igualdade de gênero.

Nesse contexto, é relevante recordar São Francisco de Assis, uma das figuras centrais do cristianismo, que, diferentemente de muitos líderes religiosos medievais, reconheceu a importância da mulher na vivência da fé. Sua proximidade com Santa Clara de Assis, a quem incentivou a fundar a Ordem das Clarissas, demonstra seu compromisso com uma espiritualidade acessível tanto aos homens quanto às mulheres, promovendo uma visão mais inclusiva da experiência religiosa. Embora não tenha desafiado diretamente as estruturas patriarcais da Igreja, São Francisco foi um dos poucos que permitiram às mulheres maior protagonismo dentro da vivência franciscana, deixando um legado que ainda hoje inspira reflexões sobre o papel feminino na Igreja.

Séculos depois, Leão XIII, papa entre 1878 e 1903, consolidou sua influência na Doutrina Social da Igreja, defendendo os direitos dos trabalhadores e condenando a exploração econômica. Em sua encíclica Rerum Novarum (1891), abordou a questão da desigualdade social e da proteção aos mais pobres, mencionando a necessidade de garantir condições dignas para trabalhadoras e mães de família, embora ainda dentro da concepção tradicional da mulher como cuidadora. Seu pontificado não representou uma ruptura com o modelo patriarcal, mas introduziu reflexões sobre a necessidade de justiça social que, posteriormente, influenciaram discussões sobre os direitos das mulheres no século XX.

Bergoglio e a justiça de gênero

Nesse contexto, Francisco se destacou como um dos pontífices que mais dialogou sobre o papel das mulheres na Igreja, abrindo debates sobre sua atuação e promovendo reformas que, embora tímidas, sinalizaram uma possível mudança de paradigma. Durante seu papado, ele criou a Comissão para o Diaconato Feminino, o que abriu debates sobre uma possível ampliação da atuação feminina no clero. Além disso, ele nomeou mulheres para cargos de alto nível dentro da Cúria Romana, algo inédito na história da Igreja. Seu discurso frequentemente apontava a necessidade de um protagonismo maior para as mulheres na estrutura eclesiástica, embora sem romper com as restrições impostas ao sacerdócio feminino.

Contudo, o papado de Francisco também recebeu críticas por não avançar o suficiente na questão da ordenação feminina e na equiparação de direitos entre homens e mulheres dentro da Igreja. Apesar do tom progressista de suas declarações, setores feministas e teólogos mais críticos consideram que suas ações concretas ficaram aquém das expectativas de transformação real da estrutura clerical.

Embora Papa Francisco tenha promovido avanços, como a nomeação de mulheres para cargos na Cúria Romana e a criação da Comissão para o Diaconato Feminino, seu papado também recebeu críticas por não ter avançado na ordenação feminina e na equiparação de direitos dentro da estrutura eclesiástica. A expectativa em torno de Leão XIV é que ele possa ir além das reformas simbólicas e promover mudanças estruturais que garantam maior inclusão das mulheres na Igreja.

Leão XIV: continuidade ou ruptura na inclusão feminina?

Com a eleição de Leão XIV, reacendem-se as esperanças quanto ao futuro da Igreja Católica no que diz respeito à inclusão feminina, igualdade de gênero e justiça social. A escolha de seu nome pontifício pode indicar uma continuidade das políticas progressistas defendidas por Papa Francisco e, historicamente, por Leão XIII, reforçando o compromisso com pautas que transcendem as tradições eclesiásticas rígidas. A proximidade entre Leão XIV e Papa Francisco é um fator relevante na análise do novo pontificado. O vínculo entre ambos remonta ao período em que Leão XIV atuava como cardeal, sendo um dos clérigos mais alinhados às propostas de Francisco. Este relacionamento próximo sugere que Leão XIV pode seguir os passos do papa argentino no que diz respeito a políticas voltadas à justiça social, inclusão de minorias e diálogo inter-religioso.

Com a ascensão de Leão XIV, surgem dúvidas sobre até que ponto ele seguirá a trajetória de Francisco ou imprimirá um novo ritmo ao debate sobre igualdade de gênero na Igreja, pois ainda há resistência interna ao sacerdócio feminino, à participação das mulheres nas decisões eclesiásticas e à reformulação do pensamento teológico sobre gênero. No entanto, com um papa que escolheu um nome pontifício com histórico progressista, nós mulheres esperamos que seu pontificado possa avançar em reformas estruturais para garantir um espaço mais equitativo às mulheres dentro da Igreja Católica e na sociedade.

Um papado em construção

A história da Igreja mostra que mudanças profundas ocorrem lentamente, e o papel das mulheres na instituição continua sendo um dos pontos de maior debate interno. Leão XIV terá a possibilidade de continuar avançando frente à justiça de gênero, ainda que a resistência interna e as pressões de setores mais conservadores possam limitar seu impacto. Seu posicionamento sobre o tema será decisivo para definir os rumos da Igreja no século XXI.

Mary Astell, pensadora feminista, ao questionar a exclusão intelectual das mulheres, afirmou: "Se Deus deu tanto às mulheres como aos homens almas inteligentes, por que elas devem ser proibidas de se desenvolver intelectualmente?". Essa crítica ecoa na luta por um maior protagonismo feminino dentro da Igreja, especialmente na reivindicação por espaços de liderança e participação ativa na teologia e no clero. Historicamente, a instituição manteve as mulheres em papéis secundários, limitando sua atuação nas decisões eclesiásticas.

Ainda é cedo para avaliar se o papado de Leão XIV representará um avanço significativo ou se manterá uma postura cautelosa e tradicional, mas a necessidade de transformação é evidente. Como afirmou Elizabeth Cady Stanton, ativista dos direitos das mulheres: "A história da humanidade é uma história de repetidas ofensas e usurpações por parte do homem em relação à mulher". A Igreja, como instituição influente, tem o poder de romper com essa tradição e abrir espaço para uma participação feminina mais equitativa. No entanto, seu histórico de resistência às mudanças estruturais lança dúvidas sobre a real disposição em promover avanços concretos.

Acompanhar os próximos movimentos de seu pontificado será essencial para compreender se seu nome e discurso representam uma genuína mudança de paradigma ou apenas uma estratégia de continuidade dentro dos moldes tradicionais da Igreja. Porém, diante da necessidade urgente de revisão de valores e inclusão efetiva, a hesitação institucional pode comprometer ainda mais sua relevância no mundo contemporâneo.

Persistir na exclusão feminina não apenas distancia a Igreja de uma sociedade cada vez mais consciente de sua desigualdade histórica, mas também reforça a percepção de que suas reformas são superficiais, evitando confrontar as estruturas patriarcais que sustentam sua hierarquia. Se Leão XIV optar por um caminho de inércia, repetirá o padrão de pontificados que reconhecem, mas pouco transformam. E, nesse cenário, a promessa de mudança pode se tornar apenas um discurso vazio, incapaz de refletir uma nova era de equidade e representatividade real dentro da Igreja.

Referências Bibliográficas

ASTELL, Mary. A Serious Proposal to the Ladies. London: Richard Wilkin, 1694.
BEAUVOIR, Simone de. O Segundo Sexo. São Paulo: Nova Fronteira, 1949.
Cady STANTON, Elizabeth. The Woman’s Bible. New York: European Publishing Company, 1895.
JOÃO PAULO II. Mulieris Dignitatem: Sobre a Dignidade e a Vocação da Mulher. Vaticano, 1988.
LEÃO XIII. Rerum Novarum: Sobre a Condição dos Operários. Vaticano, 1891.

Referências Webgráficas

MARIE CLAIRE. O que pensa Leão XIV sobre a ordenação de mulheres pela Igreja Católica? Disponível em: https://revistamarieclaire.globo.com/direitos-das-mulheres/noticia/2025/05/o-que-pensa-leao-xiv-sobre-o-papel-das-mulheres-na-igreja-catolica.ghtml 
Acesso em: 10 maio 2025.

MÉTROPOLES. Em Roma, freiras defendem papel das mulheres na Igreja Católica. Disponível em: https://www.metropoles.com/mundo/em-roma-freiras-defendem-papel-das-mulheres-na-igreja-catolica Acesso em: 11 maio 2025.

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Sobre a autora: 

Vanessa Carvalho de Mello é brasileira, teóloga, líder religiosa e ativista pelos direitos humanos. Coordena a pós-graduação em Teologias Contextuais e Desafios Contemporâneos no Instituto Casa de Vida e é professora no Mestrado em Liderança para a Transformação do CETI CONTINENTAL. Atua como pesquisadora sobre violência intrafamiliar em lares cristãos na organização Paz y Esperanza – Filial Brasil, onde também é coordenadora. Representa a Rede de Liberdade e Justiça de Lausanne e integra o Conselho Diretor da Iniciativa das Américas para a Transformação e a Reconciliação.

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